Paulo Melo, Tainha, monge zen, mestre, atravessou a cortina hoje. Não cheguei a ter tempo de ter intimidade com ele; conhecia-o há séculos, pelo Aníbal. Fui à casa dele, mandei emails, peguei livros emprestados, conversamos... numa "lista preliminar" sobre "zen básico" me mandou uns cem livros, determinada vez. Queria ter vivido mais ao seu lado - estou transpondo fitas cassetes com palestras dadas por ele ao longo dos anos, para mp3, e durante esses dias todos depois do carnaval tenho escutado o Paulo - tomei um susto quando o Aníbal me ligou hoje cedo dizendo "seu mestre morreu". Não chegou a ser "mestre" mesmo por falta de tempo, mas sentia uma enorme afinidade com os pensamentos e linhas seguidas por esse amigo. Abaixo, um poema de que me lembrei imediatamente quando, agora à tarde, cheguei em casa e liguei o gravador para terminar de ouvir uma das palestras:
Anunciaram que você morreu.
Meus olhos, meus ouvidos testemunharam:
A alma profunda, não.
Por isso não sinto agora a sua falta.
Sei bem que ela virá
(Pela força persuasiva do tempo).
Virá súbito um dia,
Inadvertida para os demais.
Por exemplo assim:
À mesa conversarão de uma coisa e outra.
Uma palavra lançada à toa
Baterá na franja dos lutos de sangue.
Alguém perguntará em que estou pensando,
Sorrirei sem dizer que em você
Profundamente.
Mas agora não sinto a sua falta.
(É sempre assim quando o ausente
Partiu sem se despedir:
Você não se despediu.)
Você não morreu: ausentou-se.
Direi: Faz tempo que ele não escreve.
Irei a São Paulo: você não virá ao meu hotel.
Imaginarei: Está na chacrinha de São Roque.
Saberei que não, você ausentou-se. Para outra vida?
A vida é uma só. A sua continua
Na vida que você viveu.
Por isso não sinto agora a sua falta.
Manuel Bandeira
(A Mario de Andrade ausente)
Hoon Sesshin 2012
Há 12 anos